Os Riscos do Controle Estatal das Redes Sociais Os Riscos do Controle Estatal das Redes Sociais Os Riscos do Controle Estatal das Redes Sociais Os Riscos do Controle Estatal das Redes Sociais
Os Riscos do Controle Estatal das Redes Sociais

O ministro Alexandre de Moraes afirmou recentemente que os eventos de 8 de janeiro representaram a falência do sistema de autorregulação das redes sociais1. Essa declaração não apenas carece de fundamentos sólidos, como também carrega consigo o perigoso precedente de defender um modelo de regulação estatal que pode comprometer a liberdade de expressão e abrir caminho para abusos de poder por parte de governos com tendências autoritárias.

O argumento de Moraes parte da premissa de que as plataformas digitais não foram capazes de evitar os atos de vandalismo ocorridos em 8 de janeiro. Contudo, essa visão simplifica a questão ao ignorar dois pontos cruciais: a natureza das redes sociais e a complexidade do problema de desinformação.

As redes sociais são espaços de interação humana, nos quais bilhões de usuários compartilham informações em tempo real. Mesmo com mecanismos de moderação, a velocidade de propagação das informações torna impossível eliminar todos os conteúdos considerados prejudiciais pelas plataformas antes de sua disseminação. Cobrar perfeição dessas plataformas é ignorar a própria dinâmica da comunicação digital, e exigir uma celeridade que tampouco mecanismos de controle estatal seriam capazes de alcançar.

Além disso, culpar a autorregulação é desconsiderar que os atos de 8 de janeiro foram planejados e executados por indivíduos com motivações políticas e organizados em diversos espaços, incluindo fora das redes sociais. A responsabilização exclusiva das plataformas é desviar o foco dos reais autores e beneficiários dessas ações.

A proposta implícita de Moraes é a criação de mecanismos de regulação estatal das redes sociais. Essa ideia, embora apresentada como solução para problemas reais, esconde riscos profundos à liberdade individual e à democracia.

Em regimes autoritários como China e Rússia, o controle estatal das plataformas digitais é um instrumento de repressão. Na China, a “Great Firewall” bloqueia conteúdos contrários ao Partido Comunista, silencia dissidentes e restringe o o à informação global. Na Rússia, a legislação permite ao governo banir aplicativos e prender críticos que utilizam as redes para se manifestar.

Esses modelos demonstram como a regulação pode ser utilizada para moldar o debate público, sufocar opositores e perpetuar regimes autoritários. A liberdade de expressão, que deveria ser protegida, é corroída pela concentração de poder nas mãos do Estado.

A regulação estatal, em tese, busca combater desinformação e discursos de ódio, mas, na prática, entrega ao governo a prerrogativa de definir o que é “aceitável”. Isso cria um paradoxo: quem garante que o regulador não se tornará o censor?

No Brasil, em razão de uma polarização política, o controle estatal das redes pode facilmente ser instrumentalizado por governos para perseguir adversários. As normas regulatórias correm o risco de serem aplicadas de maneira seletiva, punindo conteúdos de oposição enquanto blindam aliados. O cenário se agrava quando lembramos que, historicamente, legislações que restringem a comunicação raramente são revertidas, consolidando a censura em nome de supostos “interesses públicos”.

É inegável que as redes sociais enfrentam desafios, mas soluções efetivas devem vir da combinação de autorregulação, pressão social e educação midiática. A sociedade civil também desempenha um papel fundamental. O combate à desinformação a pela promoção de um público crítico, capaz de avaliar a veracidade das informações que consome. Educação digital e campanhas de conscientização são ferramentas muito mais eficazes para lidar com esses desafios do que a regulação estatal.

O argumento de que as redes sociais falharam na autorregulação ignora que o controle perfeito da comunicação é uma utopia. Transferir esse controle para o Estado é trocar uma falha técnica por um risco político incalculável. A história nos ensina que a liberdade é mais facilmente perdida por meio de pequenas concessões do que por ataques diretos. Permitir que o Estado regule as redes sociais sob o pretexto de segurança pode ser o primeiro o para um caminho sem volta, no qual a liberdade de expressão se transforma em um privilégio controlado pelo governo.

A autonomia das redes sociais, com todos os seus defeitos, é essencial. A alternativa, como mostram os exemplos da China e da Rússia, é um futuro em que a opinião dissidente desaparece no silêncio imposto pelo Estado.

1 https://g1.globo.com/politica/noticia/2024/11/28/moraes-8-de-janeiro-demonstrou-a-total-falencia-do-sistema-de-autorregulacao-das-redes-sociais.ghtml